Andar pelas ruas de Oeiras me faz um bem danado. Deixo-me envolver pela história que pulsa em seus prédios, dos tempos em que a cidade abrigava o título de capital do Piauí. O coração palpita quando imagino os bailes que a sociedade dançou no Círculo Operário, onde hoje se instala a Prefeitura Municipal. Ou a Igreja Matriz, primeiro templo regular do Piauí, que na visão de Dagoberto Carvalho Jr., “é o grande cemitério de nossos antepassados”. A imponência do sobrado do major Selemérico, a cadeia velha, a antiga casa do cônego, hoje pousada, o Museu de Arte Sacra, a Igreja do Rosário, o Pé de Jesus ou a Casa da Pólvora remetem a um passado que me cativa, como deve cativar todo pesquisador. A Casa da Pólvora, então...
Estava um dia ensolarado quando saí em busca da Casa da Pólvora. Infelizmente, Oeiras não está sinalizada para facilitar a vida de seus visitantes, mas a boa vontade dos oeirenses me apontou a exata posição da casa que foi erguida para que os portugueses fabricassem a pólvora, em princípios do século XIX. Está com aspecto de abandono, empoeirada, o teto fragilizado. Guarda um pequeno canhão, onde se vê ao lado um buraco redondo no chão que servia para o preparo da munição.
A Casa da Pólvora é uma construção simples, de apenas uma sala, toda feita de pedras superpostas tendo o barro por argamassa. Está erguida sobre um lajedo, cercada por residências, e encontrá-la não é tão simples. Uma das vias de acesso passa obrigatoriamente pelo Pé de Jesus, uma estranha marca de um pé esquerdo gravada sobre um dos lajedos, ao lado de um monte de pedras que sepultam o pé do diabo. Dizem os moradores que a mesma mão que acende uma vela a Jesus deve jogar uma pedra sobre o diabo, daí o monte que não pára de crescer.
Mas bom mesmo foi encontrar Felipe em meio àquele sol escaldante, mas prazeroso. Felipe me ajudou a entender melhor a Casa da Pólvora. Não que ele soubesse a história, mas pela presteza em descobrir os caminhos que me levaram à informação. Quando me viu curioso, tentando decifrar aquele estranho monumento, aproximou-se e perguntou se eu já havia visto a casa por dentro. Com a negativa, imediatamente apressou-se em chamar uma senhora que guardava a imensa chave de uma fechadura que pertenceu à Cadeia Velha.
Felipe é um garoto negro, aparentando dez anos de idade, que carrega no rosto uma simpatia contagiante. É aquela pessoa que você tem a impressão já conhecer de longas datas, sorridente, prestativo e simples. Quando notou que eu me preparava para sair, perguntou se eu gostaria de conhecer o Pé de Jesus. Levou-me até lá, apontou-me a marca fincada na laje e advertiu-me sobre o pé do diabo, ao lado, soterrado. Depois, me falou dos templos de Oeiras. Queria percorrê-los comigo, mas o meu tempo havia se esgotado.
O garoto Felipe nada mais é do que a representação da hospitalidade do povo oeirense. Por diversas vezes tive que recorrer a informações com transeuntes e todos demonstraram grande presteza ao repassar a informação correta. Não resta dúvida de que o Piauí é um estado receptivo, com um povo hospitaleiro que vem, pausadamente e a cada ano, conquistando o seu espaço pela forma contagiante de receber e agradável de conviver. Viva Oeiras; viva o povo do Piauí!
Nota
A meio caminho entre as cidades de Regeneração e Oeiras há uma imensa plantação de eucaliptos. Polêmica, por sinal, pois os ecologistas de plantão a criticam porque os eucaliptos massacram a terra, deixando-a seca, sugando toda a água de suas entranhas, afugentando a fauna. Mas ao mesmo tempo os eucaliptos se alimentam para produzir o papel que os próprios ecologistas utilizam para registrar as suas mensagens. Cá de minha parte, achei o lugar belíssimo, encantador, com aquelas fileiras imponentes e frondosas, elegantes, fincadas em uma região de clima agradável e brisa refrescante. Se o projeto agride o meio ambiente, que o diga o IBAMA ou os órgãos responsáveis pela preservação ambiental; se foi feita uma liberação capenga para o plantio, só tenho a lamentar que vivamos em um país onde tudo se ajeita, transgredindo a legislação. Polêmicas à parte, a região é bela, bem cuidada, bonita de ver. Rodovia dos Eucaliptos. Esse é definitivamente o melhor caminho para se chegar a Oeiras.