Perfume de resedá (Teresina, Oficina da Palavra, 2009), do poeta piauiense Paulo José Cunha, tem a riqueza de Boitempo, de Carlos Drummond de Andrade, a força do Poema sujo, de Ferreira Gullar, e a eloquência da Invenção do mar, de Gerardo Mello Mourão. Mais do que poemas grandes, são grandes poemas, pela quase compulsão com que se fizeram e pela intensidade com que emocionam quem os lê. Foram criados não porque assim resolveram os autores, mas porque a eles se impôs dar-lhes forma, como destino e catarse. Escrever ou morrer, devem ter sido as opções para a escolha.
Em seu admirável poema, Paulo José Cunha desce ao mais remoto de si mesmo, à caça do tempo vivido, das brincadeiras da infância, dos tipos de rua, dos sonhos de menino e dos desejos de rapaz... Mergulho a que tem direito o poeta, “pois já bebi o sol dessas auroras / chorei poentes de amargura / e hoje venho / os pés cobertos / da poeira dos quintais / dar testemunho de meu tempo / e reclamar / a herança que me cabe / por consuetudinário direito / e certidões / passadas em cartório / onde os assentamentos / ferrados / a bico de pena / ou ponta de punhal / me asseguram / a posse dessas memórias”. São versos magistrais, que inscrevem Perfume de resedá entre as mais belas realizações da poesia brasileira contemporânea.
No correr dessa busca proustiana, emerge Teresina, não o município, a capital de estado, mas a terra em que se vive e se ama, a que Paulo José Cunha, com saber e talento, dá expressão lírica e grandeza literária. Fica-nos a lição do poeta: o que verdadeiramente imortaliza uma cidade não são prefeitos, nem estátuas de heróis nem o dinheiro que circula, mas a matéria humana e a beleza de obras como Perfume de resedá. Assim, Teresina sobreviverá ao tempo qual uma Jerusalém plantada entre rios, para a perpétua memória dos que a amam porque nela nasceram, ou porque (como eu...) a trazem, por destino e escolha, na algibeira do coração.