O GRANDE CINEMA DE DOUGLAS MACHADO
por Edmílson Caminha
Um dos valores maiores do cinema brasileiro é, sem dúvida, o documentário, gênero em que se inscrevem nomes com o relevo de Eduardo Coutinho (“Cabra marcado pra morrer”, “Edifício Master”), Vladimir Carvalho (“Conterrâneos velhos de guerra”, “O engenho de Zé Lins”), João Moreira Salles (“Santiago”) e Marcos Prado (“Estamira”). Some-se, a esses importantes diretores, o piauiense Douglas Machado, cuja obra se distingue pelo conteúdo humano e pela competência técnica. Seus filmes que honram a cultura do Piauí e engrandecem a arte brasileira, como realizações merecedoras do aplauso da crítica e do respeito do público.
Tome-se, por exemplo, a série “Literatura: Brasil”, sobre os escritores H. Dobal (“Um homem particular”, 2002), Ariano Suassuna (“O sertãomundo de Suassuna”, 2003), Marcos Vinicios Vilaça (“O artesão da palavra”, 2005) e Luiz Antônio de Assis Brasil (“O códice e o cinzel”, 2007). São documentários excelentes, em que Douglas Machado nos revela não apenas a dimensão literária dos autores, mas também o lugar e o tempo em que vivem — isto é, o homem na sua inteireza, como artista e como pessoa. Assim, vemos Dobal prisioneiro da doença que acabaria por matá-lo; a emoção de Ariano em Fortaleza, no Teatro José de Alencar, com jovens dançarinos moradores da favela; Marcos Vilaça em conversa com o motorista pelo trânsito do Rio, rumo à Academia Brasileira de Letras; o romancista gaúcho Assis Brasil a cantarolar ópera, enquanto dirige o carro de Porto Alegre em direção a Gramado. Melhores do que uma boa aula de literatura, os filmes deveriam ser mostrados em colégios e em cursos de letras, pelo que dão a conhecer dos prosadores e poetas que homenageiam. A série continuará com “O último crítico”, sobre o paranaense Wilson Martins, tão avaro em elogios aos autores e livros que comenta.
Consagrado como documentarista, Douglas Machado já incursionou com êxito pelo cinema de ficção: em 2001, dirigiu “Cipriano”, que apresenta a terra e o povo do Piauí com a força dramática de um “Vidas secas”, de Nelson Pereira dos Santos, ou de um “Deus e o diabo na terra do sol”, de Glauber Rocha. Até porque, em filmes dessa natureza, é tênue a linha entre o testemunho e a criação, o documento e a invenção, tal o realismo que o diretor põe na história que conta e nas cenas que fotografa. Sem falar na estreita relação desses trabalhos com a literatura em que se baseiam, literatura que, não por coincidência, tanto interesse desperta em Douglas Machado.
Não admira, pois, que o cineasta piauiense receba o apoio do Instituto Dom Barreto, decisivo para que cheguem a termo os projetos que desenvolve. Eleito há pouco tempo o melhor colégio do Brasil, o Dom Barreto prova, com iniciativas como essa, o que entende por educação: um substancioso e abrangente processo de formação do homem, que ignora as limitações do giz e do apagador para fazer do mundo uma gigantesca sala de aula, em que a arte, a ciência e a própria vida ensejam a que nos construamos a nós mesmos, como seres humanos, como profissionais e como cidadãos.
Que Douglas Machado continue a merecer essa valiosa parceria, no trabalho que ilustra o Piauí e enriquece o cinema brasileiro.