Às vezes, demoramos um bocadinho para “descobrir” o que está à vista. Um exemplo: só na semana passada, visitei Coelho Neto, cidade que fica a pouco mais de 100 km de Teresina. Do município, eu sabia apenas que leva o nome de um dos autores mais prolíficos da literatura brasileira. O cidadão escreveu tantos livros que poucos leitores são capazes de se lembrar de algum. Sabia também que é a terra da Luana Miranda, a moça que, com seu sorriso esplendente, acende as manhãs. Não me era estranho o fato de um certo José Antônio Costa ter migrado de lá para Teresina onde se tornou Jota A, o mais premiado dos cartunistas brasileiros. Não sabia, mas suspeitava que talvez existisse, na cidade, pelo menos uma dúzia de instituições com o nome do eterno donatário do Maranhão, José Sarney. Errei por pouco.
O certo é que, a convite da Secretaria de Educação do município, fui participar da 3ª edição do Salão do Livro de Coelho Neto (3º SALICON), cujo autor homenageado era o poeta Salgado Maranhão. Negar-me a participar de um evento que homenageia Salgado seria pouco menos que uma traição. Venho acompanhando a trajetória literária deste irmão desde a época em que ele vendia imagens de gesso nos bairros pobres de Teresina. Não conheço nenhum outro poeta contemporâneo que tenha se entregado tanto ao labor poético como ele. Salgado Maranhão é poeta em tempo integral. É bom que seus conterrâneos o “descubram”: os americanos já o fizeram. Para quem ainda não sabe, entre os meses de setembro e dezembro do ano em curso, Salgado visitará, como convidado, 50 universidades americanas (entre elas, Harvard e Yale) , lançando seus livros e fazendo palestras sobre poesia, um feito e tanto para um cidadão que, até os 15 anos de idade, era semianalfabeto. Salgado tem fôlego para ir muito mais longe. Podem apostar. O Salão foi um baita sucesso. Entre os convidados desta edição, figuravam Salgado Maranhão, João Cláudio Moreno, Jota A, Dilercy Adller, Quincas Vilaneto, Wellington Soares e Wybson Carvalho, para citar apenas os mais conhecidos.
A despeito do curtíssimo espaço de tempo que passei na cidade, pude perceber algo que me deixou muito impressionado: a presença de atividades artísticas nas escolas em caráter regular. Graças ao empenho do músico Adelino Santos, filho do maestro Luiz Santos, de saudosa memória, a música passou a integrar a grade curricular das escolas de Coelho Neto. Assim, entre noções de análise sintática e números fracionários, a molecada se debruça sobre pentagramas para descobrir as diferenças entre fusas e colcheias. Os que efetivamente revelam maior interesse pela música recebem tratamento especial. Os efeitos já se fazem sentir: por toda parte, despontam meninos tocando como gente grande.
Por absoluta falta de tempo, não pude conversar mais com meus colegas de Coelho Neto, mas fiquei sabendo que um professor iniciante recebe, por vinte horas-aula semanais, pouco mais de dois mil reais. Voltei animado: um município que ensina música nas escolas e remunera decentemente seus professores tem tudo para dar certo, mesmo que, em cada esquina, exista um monumento em homenagem ao “imorrível” donatário do Maranhão.