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Das coisas que até eu sei
Na semana passada, publiquei uma crônica – Das coisas que não entendo - questionando a conduta das “celebridades” que fazem propaganda de produtos nocivos à saúde humana. Eis a pergunta que fiz: o que levaria um ex-atleta,rico e famoso, no caso, o Ronaldo – “fenômeno”, a tornar-se garoto-propaganda de uma marca de cerveja? Por oportuno, vale lembra que Ronaldo já foi embaixador da UNICEF , até envolver-se num escândalo com travestis. Mal a crônica foi publicada, um cidadão bem-nascido me mandou um e-mail,nos seguintes termos: Professor, só muita ingenuidade ou desinformação pode levar alguém a acreditar que um simples comercial possa induzir alguém a beber mais cerveja. Os brasileiros estão bebendo mais porque gostam, querem e podem. Só isso. Tive de segurar o freio de mão para não responder de bate-pronto: Meu irmão, só um parvo ignora que a propaganda pode induzir alguém, notadamente os jovens, a consumir até veneno.Aliás, tem muita gente envenenando-se com comidas enlatadas, bebidas,remédios,ideologias, preceitos religiosos, etc. Não tivesse o poder de convencer alguém a consumir alguma coisa, para que serviria a publicidade? O cidadão que me mandou o e-mail é a melhor prova de que uma “boa” publicidade efetivamente funciona. O argumento usado por ele é o mesmo brandido pelo cartel da cerveja sempre que o governo tenta impor algum limite no horário de veiculação de propaganda de bebidas alcoólicas.
Outro argumento bastante usado é o de que a indústria da bebida “paga muitos impostos, gera milhares de empregos e ajuda o esporte brasileiro”. Seria oportuno que alguém explicasse o quanto o governo, ou melhor, o quanto nós pagamos pelos danos provocadas pelo álcool. Independentemente de bebermos ou não, a conta é rateada entre todos. Para quem acredita que propaganda não influencia ninguém, posso citar um exemplo que me afeta diretamente. Eu ainda vivia em São Raimundo Nonato, no início da década de 1960, quando ouvi, no rádio de um vizinho, a campanha de lançamento de um creme dental novo, “o único com hexaclorofeno nas listras vermelhas”. O rótulo também era novo: Signal. Na cidadezinha perdida no sertão do Piauí, em matéria de dentifrícios, só conhecíamos Colippe e Kolynos. Por simples curiosidade, resolvi experimentar a novidade. Experimentei e, acreditem se quiser,fiquei literalmente viciado. Se o tal hexaclorofeno fosse uma substância cancerígena, eu já estaria morto. Há mais de 50 anos, uso o mesmo creme dental, embora não saiba exatamente o que venha a ser o bendito hexaclorofeno. O nome do creme dental mudou: hoje é Closeup, mas as listras vermelhas permanecem lá, vivas, fascinantes, “viciantes “. Não tenho o menor pudor em afirmar que, induzidos pela propaganda, sou viciado em Englhish Lavender e hexaclorofeno. Eu poderia acrescentar mulher, sempre presente em propaganda de tudo: de xampu a pneu de trator. Pensando bem, é melhor não: viciei-me em mulher muito antes de saber que existia uma coisa chamada propaganda...
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