Poucos escritores exerceram tanta influência em nossa literatura quanto Rubem Fonseca tem exercido nos últimos quarenta anos.
Machado de Assis é o único a superá-lo. Porém Machado é Machado e fim de discussão.
Mas a que se deve tanta influência do autor de Feliz ano novo, se vivemos em uma época em que a liberdade de criação é ilimitada e incentivada? Por que esse autor é tão influente, embora não seja tão genial quanto Machado e Guimarães Rosa?
Deve haver muitas respostas para essas perguntas. Vamos tentar encontrar algumas.
A primeira é que Rubem Fonseca é um autor recluso. Ele não dá entrevistas, não aparece na tevê e muito raramente vai a algum evento literário. Tem o semblante grave, quase não ri. Essa maneira de ser casa-se muito bem com a enorme atração que a maioria das pessoas tem por seres e coisas que elas não entendem ou que delas não se aproximam. Nada nos atrai tanto como o distante, o enigmático, o incognoscível. Não é à toa que as religiões, mesmo numa época de alta tecnologia, continuam em alta: elas nos prometem o contato com o supremo desconhecido – o que vem depois da morte. É uma comparação meio tosca, mas é isto mesmo: a leitura de livros religiosos não aplaca totalmente a nossa ânsia de saber o que virá após a nossa morte; a leitura dos livros de Rubem Fonseca não diminui nossa vontade de conhecê-lo melhor, de pelo menos ler uma entrevista sua.
Outra resposta é o realismo brutal que está presente em seus contos e romances. Pancadaria, tiros, facadas, estupros, prostituição, assassinatos e outras bestialidades abundam em seus livros, desde o primeiro – Os prisioneiros –, publicado em 1963, até o mais recente livro de contos – Ela e outras mulheres, publicado em 2006. Esse tipo de texto, em que a realidade cotidiana é mostrada tal qual como ocorre, essa fotografia verbal da realidade, tão comum em Rubem Fonseca, é o tipo de narrativa preferida dos brasileiros. Nós gostamos das histórias baseadas em fatos reais, dos textos que nos mostram os nossos mais graves problemas sociais e psicológicos, embora esse realismo não seja prova de que uma obra que o mostre tenha valor estético só por isso ou principalmente por isso. Mas esse realismo é tão evidente em Rubem Fonseca, que ele tem um conto que se intitula Relato de ocorrência em que qualquer semelhança não é mera coincidência. Ou seja, ele é, guardadas as devidas proporções, um escritor realista. Só não é naturalista também porque não aborda a questão hereditária ideologicamente, mas aproxima-se disso num dos contos de seu último livro acima citado.
Uma terceira resposta é o estilo meio arrogante e exibicionista. Em vários de seus contos e romances, ele exibe conhecimentos específicos sobre determinados temas que são desnecessários para a narrativa em si. Conhecimentos sobre musculação, sobre armas brancas, sobre armas de fogo, sobre o jogo de xadrez e outros servem apenas para o autor se mostrar diante do leitor como alguém culto. E o leitor, coitado, deslumbrado diante de tanto saber, humilhado em sua ignorância, redobra sua admiração pelo escritor.
Com certeza, devem existir muitas outras razões que levam pessoas à admiração por Rubem Fonseca e à imitação de sua obra.
No seu enorme bando de influenciados, há aqueles em pequeno número, como Luiz Vilela, que reconhecem a influência, mas dela se afastam bastante e constroem uma obra bem diferente; há aqueles que o imitam e assumem que são influenciados por ele, como Patrícia Melo, e finalmente o grupo com o maior número, o dos imitadores que fingem não imitá-lo. Esses existem no país inteiro. Aqui mesmo em Teresina, há uns dois ou três. A imitação dessa turma é tão servil, que indiretamente se percebe no estilo deles a vontade malcontida de dizer esta frase: “Quero ser Rubem Fonseca.”