Volta e meia o governo mostra sua cara. Quando não é pela via escusa de desvio do dinheiro público, com o Mensalão ocupando a pole position, é pela lerdeza, pelo descaso com a meritocracia, além da ambigüidade política e despreparo na gestão da coisa pública. O que se vê, na verdade, é o Bolsa Família, um programa assistencialista de cooptação de pessoas, descolado de uma estratégia global de desenvolvimento voltada para geração de emprego e renda, atendimento às demandas sociais, investimento em infra-estrutura, etc.
O mais recente papelão do governo do PT foi o posicionamento público do ministro dos Esportes Aldo Rabelo, quando viu a ex-ministra Marina Silva carregando uma bandeira na abertura das Olimpíadas de 2012, em Londres.
Adotando uma postura só vista em regimes fortes que não fazem diferença entre governo, país e partido, descontrolado e vítima do seu próprio ofidiário, o ministro com cara de “Ditadura do Proletariado” não contou conversa e alfinetou: “A Marina sempre teve boas relações com a aristocracia europeia. Não podemos determinar quem a Casa Real vai convidar. Fazer o quê?” Além de grosseiro, o ministro deu provas de que desconhece a liturgia da festa, o simbolismo da bandeira olímpica e a intenção política do governo inglês com a abertura do evento. Cometeu outro equívoco inominável quando mencionou a Casa Real, ignorando também que não coube à longeva Rainha Elizabeth II organizar as Olimpíadas, e sim ao Comitê Olímpico.
O ministro Aldo Rabelo e outros integrantes da comitiva presidencial continuam sem entender e absorver o espírito olímpico que prevê a participação de todos os países e continentes na abertura, razão pela qual os eleitos representavam ali o combate à pobreza, a luta por justiça, os pacificadores, o esforço de convivência entre os povos e a preservação da Terra. E quando o assunto foi a preservação da Terra, os organizadores do evento não titubearam: Marina Silva, uma frágil senhora que dedicou a vida a essa causa ao lado do falecido Chico Mendes. Diante do beicinho do ministro, certo representante do governo inglês resolveu dar um puxão de orelha no companheiro metalúrgico, e disse em alto e bom som: “a escolha da ex-ministra não foi política, porque este não é o momento”. Bem feito.
Fico me perguntando: quem deveria ser o porta-bandeira do governo do PT, na abertura dos jogos olímpicos de Londres? Seria José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares ou Luizinho? Acho que poderia ser qualquer um deles, desde que o casal de mestre-sala fosse Thomaz Bastos e Marcos Valério, seguido da ala dos roedores integrada pelos ministros exonerados sob a acusação de abrir o cofre da caverna de Ali Babá.
A presidente Dilma também mostrou seu destempero quando afirmou que "o Brasil fará melhor na festa de abertura. Vai levar uma escola de samba e abafar". Ao invés de elogiar os súditos da rainha, preferiu esbanjar vaidade e arrogância, numa demonstração clara de que não entendeu a grandiosidade de uma festa que mostrou para o resto do mundo aspectos relevantes da cultura inglesa, entre os quais a literatura. E ainda usou um termo chulo, quando disse que ia “abafar”. Como se a organização de um evento dessa magnitude se limitasse às esculpidas nádegas das mulatas da escola de samba da Portela.
Aldo Rabelo se sentiu traindo suas convicções ideológicas ao participar da abertura das Olimpíadas num dos mais importantes templos financeiros do capitalismo moderno, quando deveria estar numa reunião do PC do B, pensou o ministro. E descarregou a culpa:
“Olimpíadas! Hábitos excêntricos da burguesia ocidental. Meus camaradas vão pensar que fui cooptado pelos valores do capitalismo decadente. Tô fora”.
Nota: Este artigo foi inspirado em matéria de Miriam Leitão, publicada no jornal O GLOBO de 31.07.12.