Apresentei Aninha, minha namorada, a certo amigo de Teresina que veio passear em Salvador. Resolvi oferecer uma feijoada ao faminto piauiense e, conversa vai, conversa vem, ele logo disparou essa frase: você tem um sorriso muito bonito, Aninha. Até aí nada demais; muito embora eu tenha achado prudente redobrar a atenção pra coibir qualquer tentativa do libertino de me lançar no reino dos unicórnios.

 

Pra minha surpresa, ele voltou ao assunto com uma crônica recheada de frases gosmentas que nem moqueca de quiabo: Você tem um sorriso largo e profundo, mas educado e na medida certa, como um cálice de vinho do Porto que não se deixa derramar pelas bordas.

 

Considerei a situação grave, pra não dizer gravíssima, passando a exigir muita serenidade da minha parte. Tanto que, travei uma das mais ferozes batalhas comigo mesmo pra que prevalecesse a razão ao invés dos instintos bestiais que sempre comandam as atitudes dos humanos em situações assemelhadas.

 

Por questões de civilidade, e pra evitar que eu fosse julgado por crime doloso, convoquei uma reunião do Conselho de Família em regime de urgência urgentíssima, com a intenção de dividir com meus filhos a responsabilidade de possíveis atos de crueldade contra o libertino.

 

Cheguei a pensar, por exemplo, em procurar uma praia deserta, encher de areia um buraco com o desafeto lá dentro, deixando só a cabeça dele de fora. Era só esperar a maré subir. Evidente que eu estaria atento, caso aparecesse algum idiota pra lhe salvar do infortúnio. Outra opção, essa de dar inveja à Gestapo, seria amarrá-lo com arame farpado e soltar ao seu redor minha criação de abelhas africanas viciadas em hemoglobina. Ainda bem que prevaleceu meu costumeiro espírito democrático de ouvir o Conselho de Família.

 

A reunião do Conselho de Família foi muito tensa em alguns momentos. Danilo, por exemplo, desviando-se do seu comportamento habitualmente cordial e dócil, mas com os olhos injetados de puro ódio, prometeu partir para o pugilato assim que encontrasse o libertino. Catulo, por sua vez, sugeriu que o assunto caísse no esquecimento, alertando, na condição de advogado, que qualquer ato de violência poderia me levar à prisão perpétua. E concluiu, pedindo que Aninha fosse ouvida.

 

Considerei sensata a sugestão, enviando a tal crônica pra o conhecimento dela. Ao telefone, pedi que opinasse sobre as minhas reais intenções de retaliação.

Como sempre muito ponderada, Aninha leu a crônica e retornou: Nizinho, amore mio! Nizinho, encanto de mi vida, o meu sorriso só pertence a você. Deixe pra o piauiense as lambretas que ele tanto ama. Esse argumento me convenceu e o libertino foi salvo pelo gongo.

 

Achei por bem fazer um apelo ao galanteador pra não copiar o tratamento que Aninha me dispensa, querendo me chamar também de Nizinho. É assédio sexual e dá cadeia, avisei. Na dúvida, sugeri que ligasse pra Mike Tyson e ele contará a experiência que viveu no Condado de Maricopa, no Arizona.